sábado, 18 de junho de 2011

O Sorriso



Antoine de Saint-Exupéry conhecido pelo seu livro O Principezinho, era aviador de profissão, ele que um dia cruzou as nuvens na sua avioneta para não mais regressar, foi durante a sua juventude um idealista. Acreditava como todos os jovens que poderia melhorar o mundo, isto é, moldá-lo à sua maneira, como tal partiu para Espanha para combater na guerra civil do lado republicano.
Numa tarde de malgorada estratégia militar foi feito prisioneiro junto aos montes pirinaicos pelo exército nacional. Triste e amargurado por saber que a morte o aguardava na manhã seguinte frente a um pelotão de fuzilamento, procurou nos bolsos um cigarro para se escapulir mentalmente daquele catre hediondo, encontrou um pequeno bago já meio consumido, buscou ainda sem sucesso uma fonte de fogo para o acender mas sem sucesso. Olhou para o jovem à porta da cela, falava pouco espanhol mas como se costuma dizer a necessidade aguça o engenho, a sua primeira reacção foi sorrir a forma universal de estabelecer contacto, o guarda olhou para o prisioneiro logo desviando o olhar com desdém mas é da psicologia quando algo nos prende a atenção ainda que de forma inconsciente voltar a procurar com o olhar a razão da nossa curiosidade.
Saint-Exupery fez então um gesto a imitar um fósforo, o guarda entendeu, aproximou-se cautelosamente do aprisionado e alumiou-lhe o patético pedaço de tabaco. O francês agradeceu e entre uma baforada de fumo perguntou: como te chamas? O outro nada respondeu. Continuou o escritor, tens filhos? Desta vez o guarda acenou que sim com a cabeça. Esta noite, começou a dizer, quando abraçares os teus filhos ao regressar a casa diz-lhes que eu não poderei abraçar nunca mais as minhas crianças. Explica-lhes ainda que a razão para tu poderes abraçar os teus filhos e eu não é porque tu escolheste o caminho errado no momento certo enquanto que escolhi o caminho certo no momento errado.
O guarda teve um ataque de raiva, abriu a porta da cela, agarrou Saint-Exupery pela camisa e arrastou-o para fora da prisão, o escritor ficou lívido, tinha a certeza de que fora longe de mais e que seria morto de imediato, contudo ao atingir o exterior, o soldado nacionalista apontou para os Pirinéus explicando-lhe por gestos que se fosse embora. Desconhecemos o que aconteceu ao jovem guarda ou o que lhe sucedeu depois de ter deixado um preso evadir-se mas Saint-Exupery não esqueceu este acto de caridade, prestando merecida homenagem ao soldado anónimo relatando vários anos passados esta história num conto intitulado: O Sorriso.

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